Personagens

Ultimamente tenho mantido minhas leituras restritas às leituras requeridas pela faculdade, seja por trabalho, seja por grupo de estudos, seja por cadeiras… No entanto, acredito que todo “letrista” (inclusive eu) sempre tenha aquele livro socado no fundo da mochila para os trajetos no ônibus, ou então aquelas literaturas de banheiro. Seja como for, por mais atarefado que esteja o letrista, ele sempre vai ter um livro que lê por prazer.

Pode se tratar de um livro bem velho, ou um recém comprado, uma edição especial com capa dura, folhas de bordas douradas, ou uma edição baratinha em papel jornal. O autor pode escrever de maneira rebuscada e nos atrair pelo domínio sobre a língua, ou pode ser uma tradução excelente, ou então a escrita pode até não ter nada de tão especial, mas nos atrai pela complexidade da história. Pelos personagens intrincados.

Quanto aos personagens, eles é que são a alma de uma boa história. Podem ser pessoas, animais, até mesmo estações do ano ou locais no tempo e espaço. No entanto, foquemo-nos nos personagens pessoas. Sempre que leio alguma coisa, consigo identificar claramente quatro padrões diferentes na formação de personagens, quase impossíveis de serem driblados por quem escreve.

Primeiramente, temos o “bonzinho” chato. O bonzinho chato é aquele sujeito que foi pretendido como herói por quem escreveu – ou não, quem sabe –, mas é tão entediante que faz com que o leitor torça contra ele somente para ver sua desgraça e vê-lo aprender alguma lição de vida. Por mais que o autor nos apresente seu passado e argumente conosco mostrando motivos para gostarmos do sujeito, não adianta. Ele é entediante, e queremos vê-lo no espeto.

Em seguida, temos o “bonzinho” herói. Esse, de fato, nos convence. Torcemos por ele e aprovamos suas ações. Ele mostra que aprendeu com suas dificuldades no passado, ou, mesmo que não tenha tido tantas dificuldades assim, ele simplesmente nos cativa. Pode ser por afinidade, ou porque nos identificamos com ele, ou porque ele consegue ser herói e fugir do estereótipo. Aqui entra também o que chamamos ‘anti-herói’, que é apenas o bonzinho não ortodoxo. Enfim, certamente vamos torcer por ele. A menos que ele encontre e tenha de enfrentar um…

… “vilão” carismático. O vilão carismático é o personagem que vai fazer você se perguntar se no fundo, no fundo, você é mesmo uma pessoa tão boa quanto pensa que é. Ele é tão charmoso, convincente e interessante que você aprova tudo o que ele faz, mesmo que sejam  as maiores atrocidades. Não se trata em absoluto do anti-herói. Esse sujeito é vilão mesmo, só está ali para ver o circo pegar fogo, mas é um personagem tão cool que, no fim, você se pega não só torcendo para ele, como justificando suas atitudes malignas. Ou não justifica, aceita que você gosta da maldade e exclama: “Se tá no inferno, abraça o capeta!”

Em contrapartida, sempre há o vilão que cumpre com o seu papel de ser odiado. Pode ser aquela megera de uma novela mexicana. Aquele sujeito tão ruim que não oferece para o pobre leitor nem uma profundidade de caráter sobre a qual refletir, ou que oferece pesadelos. Pode ser o vilão tradicional bem construído, que realmente dá pesadelos e é odiado, ou um vilão medíocre que é odiado pelo simples fato de não estar no mesmo patamar que os outros personagens. O vilão risível de desenhos animados, por exemplo.

Trato apenas de literatura popular, pois bem sabemos que na literatura canônica os personagens são bem mais profundos do que uma mera classificação em “bem” e “mal” pode abranger.

Claro, essa mesma classificação também depende da interpretação de cada leitor, pois cada um, na verdade, lê uma história diferente vinda do mesmo livro e das mesmas palavras. Por isso, prefiro não trazer exemplos.

Mas não tratemos disso aqui. Tratemos de personagens, apenas. Leitor, você conseguiu pensar nos quatro personagens?

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